sábado, julho 02, 2005

Computadores – Análise problemática

-“Aí está ele novamente”, dirá você, caro leitor, a “testar o nosso limite de paciência”...e, bem vistas as coisas, não o culpo! Sou um daqueles insistentes casos que tudo faz para merecer a vossa atenção... mesmo escrever sobre estes temas tão “dejà-vu”.
Mas reparem, como mercenário literário sou forçado a aceitar todo o tipo de missão, sob pena da óbvia represália salarial... Mas, adiante. O que me traz à vossa companhia é, como já devem ter depreendido, uma pequena análise à comunicação no foro informático.

Há a crença de que tudo pode ser feito através do computador. Quem nunca ouviu falar de inúmeros Casamentos que iniciaram por Internet...e de inúmeros que por ela terminaram. Consigo aceitar um certo misticismo no tipo de diálogo onde não se sabe quem está do outro lado.
Ele imagina-a loura, alta, fogosa qual corcel a correr livre pelo campo, simpática, afável, do tipo de mulher que sempre vai compreender quando lhe disser que vai chegar mais tarde, e ainda vai conservar sorrisos e jantar quente até à sua chegada.
Ela imagina-o louro, alto, atleticamente entroncado, forte, simpático, afável, do género de homem que se disser que vai chegar mais tarde, ela vai conseguir conservar jantar quente e sorrisos até à sua chegada.
E arrancam para o tão aguardado encontro, palpitantes de emoção, com o único desejo de finalmente, após tantas trocas virtuais, serem brindados pela magia da presença física. 19h30m no quiosque da estação de comboios de Queluz. É preciso não chegar atrasado. Ele instruiu o agregado familiar do seu eventual prolongamento laboral. Ela avisou o marido que ia passar por casa da Carmen, sua amiga de infância, e que poderia chegar um pouco mais tarde. Nada poderia falhar.

19h00m...o “Stress” apodera-se de ambos. E se ele não for assim...e se ela não for assado... que lhe vou dizer...estarei bonita assim?...ele sua...devora pastilhas de menta...penteia o bigode...e o que lhe vou dizer?... 19h15m, ele encara a hipótese, vitimado por compreensíveis receios, de enviar um SMS a cancelar o encontro. Ela repensa a sua vida. Como é possível que, clássica mãe de família, se possa entregar a este tipo de aventuras. Será melhor cancelar tudo?...não...ele parecia tão simpático...tão sensível... Nisto, 19h29m. O comboio pára na estação.

Começa aqui uma epopeia de perfeitos e cinematográficos enredos. Aconselho os leitores mais sensíveis a abandonar de pronto a leitura ou a fazerem-se munir de um necessário atestado médico que me iliba de quaisquer responsabilidades. Assim sendo, já a nossa protagonista sorvia galões enquanto aguardava o seu correspondente, quando para seu grande espanto depara com a sua amiga Carmen.
-”E... que fazes por aqui?”, indaga.
–“tenho um encontro...- responde Carmen- realmente ainda não te tinha contado, mas vou hoje
conhecer um homem...conhecemo-nos na Internet...e tu?”...
-“Eu?...(relativamente comprometida)Eu também... Também me vou encontrar com um
homem... que conheci na Internet...e disse ao meu marido que ia para tua casa. Que horror...
que vergonha”...
- Deixa-te disso...somos amigas...fica tudo entre nós! É a primeira vez? Como é que o vais
reconhecer?...
- Uma rosa vermelha na lapela...
- E o meu uma branca...realmente, são todos iguais...

Nisto, Carmen faz um ar de absoluto espanto. Era o seu marido que aparecia com uma Rosa vermelha na lapela. Ao ver as duas juntas, disfarça, avança para elas e fala à mulher:
- Por aqui? Julguei-te em casa...
- Pois...- num misto de ironia com culpabilidade- e eu julguei-te a trabalhar...como o Mundo é...
E eis que não quando, apressado por entre a multidão, surge o famoso homem da Rosa branca, por curiosidade o marido da protagonista. Só se apercebe da mulher quando já se encaminha, desfeito em sorrisos, para perto da Carmen.
-Por aqui? Diz nervoso...
-Vim ter com a Carmen, como te disse...-igualmente nervosa-

E pronto...vou-me poupar a desnecessários esforços, caros leitores, de vos explicar o que vitima este género de situações, bem como do final desta triste mas verídica história. Tenha cuidado com os usos que dá ao seu computador e principalmente fique consciente dos riscos que acarretam este tipo de aventuras... pois após este meu aviso, fica unicamente por sua conta. Posso confiar?

--?--

Infortúnios – Análise problemática

E bem...cá estou, conforme seria de esperar, para vos obsequiar com algo verdadeiramente pessoal. Como sabem, meus caros e insubstituíveis leitores... as minhas análises sempre o foram... mas enfim... como fui protagonista de um recente e bastante insólito episódio, arrisco-me a partilha-lo com vocês.

Beneficiava eu dos prazeres da Primavera em Vila Nova de Milfontes, quando tive a infeliz ideia de telefonar a um amigo, indagando por referências gastronómicas da região. F.(o amigo) incentivou-me a uma deslocação ao belo sítio de Porto Covo, onde em determinado tasco, os petiscos eram divinais.
E segui, estando longe de imaginar o desfecho de tão infeliz conselho. Chegado ao destino constatei que, por ser época baixa, não existiam nem metade dos afamados manjares.

Nutri-me com uma satisfatória salada de polvo e com o tão típico choco frito. Fui então tentado a rematar tudo isto com uma vulgar bifana... a responsável por todas as minhas futuras desventuras. E regressei ao lar, doce lar.

Cerca das 23H, sou invadido por uma sensação de profunda indigestão. Que se passaria? A indisposição tomou por fim moldes trágicos, o que me forçou a telefonar já em desespero para o 112. O interlocutor, com o seu acentuado sotaque Alentejano, sugeriu que me deslocasse ao Hospital de Odemira, a 30Km da minha casa, ou seja, da casa de um amigo que gentilmente a cedeu para estas minhas mini-férias.

Fiz-lhe ver que a sua proposta não era razoável, tendo em conta que nem sequer conseguia encarar a hipótese de me mexer. Optou então por enviar uma ambulância, facto só dificultado pela minha absoluta ignorância em relação à correcta direcção da casa.
Mais explicação, menos explicação e lá apareceu. Entrei nela em estado absolutamente crítico, depois de devolver ao exterior tudo o que houvera ingerido no Tasco aconselhado pelo “amigo”. Pouco depois, sou brindado pela companhia de um casal de feirantes com dois dos seus respectivos rebentos.
O pai, criatura algo rude e bastante desiludida com o atraso da viatura, brinda-nos a todos com um monólogo intrinsecamente pessoal sobre a inadmissível situação da demora, culminando na destruição maciça da árvore genealógica do condutor.
Os petizes choravam, a mãe mandava calar o pai que por sua vez mandava calar a mãe. O condutor seguia e eu gemia...quadro completo, como imaginam.

Uma vez no hospital e contorcido com insuportáveis dores, calculei que de pronto seria atendido. Meia hora depois, tenho finalmente a visão do que me pareceu ser uma enfermeira. Com a pouca energia que tinha, esforcei-me por lhe relatar o meu caso... Tarefa ingrata: Quanto mais me contorcia mais ela me indagava o código postal e o nome da rua de onde vinha. Resolvido este pequeno pormenor, tive então direito à posição horizontal numa confortável maca.

Fui novamente brindado com 45 minutos de puro isolamento, com vista a uma eventual limpeza de espírito, supus. Tenho então e como recompensa, a presença de um legítimo licenciado em Medicina, que empurra a minha maca para outra sala onde se encontravam os meus já conhecidos companheiros de viagem. À medida que me colocavam o soro, assisti à nobre tarefa do pai, já bastante alterado pela situação, convencer a herdeira a “evacuar” para um penico posto no meio da sala. –“Faz força”- Dizia-lhe...-“Faz força que faz bem”.
E foi já com a seringa no braço que assisti, como se de algo normal se tratasse, à indisposição da outra criança ter repercussões sobre grande parte de um inocente sofá que jazia tranquilo no seu canto. E choravam...e o pai voltou a gritar pelo Médico...e a Mãe continuou a mandar calar o Pai...e eu continuei a gemer.

Foi a última vez que tive contacto com Almas humanas nessa noite. Não sei o que sucedeu aos meus colegas de viagem e sofrimento. Só pelas 9h da manhã visualizei novamente o Médico, que me retirou o soro e disse que “estava livre” para sair quando quisesse. Tentei abusar um pouco mais da hospitalidade, dado que ainda não me sentia bem, mas melhorei rapidamente quando a Enfermeira precisou da maca para outro paciente.

Levantei-me, segui para a porta, chamei um Táxi e regressei a Vila Nova onde cheguei no princípio da manhã. Intoxicação alimentar, disseram-me. Resta-me portanto agradecer ao meu amigo F. o conselho do Restaurante e à hospitalidade do Hospital de Odemira, pois foi graças a todos eles que tive uma noite invulgarmente diferente. Bem hajam!

--?--

SEMÁFOROS-ANÁLISE PROBLEMÁTICA

Não passa de um vulgar e banal semáforo...que poderá existir de atractivo em semelhante objecto? Alto e cinzento, tem como único objectivo controlar os fluxos de trânsito que o rodeiam. E lá fica, imóvel no seu canto, em constante câmbio de luzes.

Compreendo a sua posição, caro leitor, quando afirma que não é dos objectos mais interessantes. Calculo no entanto a sua curiosidade em terminar de ler estas linhas pelo simples facto de conhecer o grau de paranóia que leva alguém a manifestar-se sobre tão árido tema.
Bem, é a partir daqui, caro leitor, que entramos em contradição...pois sou da opinião que o referido objecto atinge um grau de civilização muito superior à grande parte, por exemplo, dos automobilistas deste país.

Senão, vejamos: por muito ácido úrico que exista acumulado na sua bexiga, não há relato de nenhum semáforo a ser passeado pela sua dona e a verter águas para cima de qualquer indefeso canídeo que por ali repousasse.
Calculo que por agora, caro leitor, a hipótese de uma mudança de opinião a respeito do inocente objecto já se comece a afigurar como válida.

Mas, há mais: há pouco tempo, uma vizinha minha colidiu inadvertidamente no semáforo da esquina, aquando uma das suas muitas infrutíferas tentativas de estacionamento em marcha-atrás.
Ao ouvir o embate, sai nervosa do carro para verificar os estragos – não do inocente semáforo- mas sim do carro que o marido tão gentilmente lhe confiara.
Verificando ser só um arranhão insiste na manobra, tendo por acrescento ao seu já perturbado estado de espírito o coro de proporções Búlgaras das buzinas dos automobilistas que pela situação se viram impedidos de rumar aos seus “doces lares” e assistir ao último episódio do BIG BROTHER VIII. Nova tentativa, nova pancada no desgraçado semáforo.
Tomada por um repente de energia, sai do carro e grita nervosa para os selváticos declamadores de buzina: “- Então não vêm que a culpa é do poste??? Estão pr`aí a buzinar...”. Dito isto entra novamente para o veículo, esquece a manobra, e arranca esbaforida pela Avenida. Reparem...o inocente do semáforo não só foi açoitado com duas magníficas pancadas ao nível do baixo-ventre, como ainda o insultam e o responsabilizam pela situação.

Francamente...não me lembro de nenhum semáforo em movimento a agredir um automóvel estacionado...mas pode ser culpa da minha assumida imaturidade neste tipo de situações.
Outro tipo de agressão a que estes desgraçados estão sujeitos é o assumido desprezo linguístico por parte de um género verbalmente aguerrido de automobilistas: “-Sacana... nunca mais abre”. Imagine-se, como se fosse uma lata de conserva com o fecho partido e, para cúmulo do desprezo, arrancam sem respeitar a sua autoridade luminosa.

Ó meus amigos e devotos leitores, será justo insultar os já tão fustigados semáforos unicamente pela sua dedicação ao dever? Que seria do mundo se fossem eles a insultar quem passa, por este tipo de motivos absurdos? Suponham que por motivos sindicais deixavam de trabalhar e iam reivindicar os seus direitos para a frente da Assembleia da República...ou pior ainda, utilizavam as luzes a seu bel-prazer. Aí sim, poderiam facilitar a deslocação aos condutores mais apressados, evitando assim ser insultados em toda a sua árvore genealógica. Seria no entanto ético?
Facilitar a passagem a uns motivaria de imediato o atraso de outros...o que numa sociedade Democrática me parece pouco justo, embora seja facto corrente em alguns sectores.
Digo-vos: encaro esses objectos como nobres Bastiões da ordem social. Como funcionários públicos que são, nunca os vi a tomar café às 11h na pastelaria da esquina nem sair do trabalho às 17h30m. Trabalham a tempo inteiro e não reclamam horas extra. Mediante o panorama, caro leitor, terão as minhas modestas linhas conseguido alterar a sua opinião?



--?--